Entrei na onda da enquete que circula na internet: “Cite um erro de português que o incomoda profundamente”. Postei no Instagram. Eis respostas:
“Menas”: Esse feminino não existe. A forma é sempre menos: menos brincadeira, menos brincadeiras, menos bonito, menos bonitos.
“Pra mim fazer”: Mim não faz nada, não conjuga verbo. Só na língua dos índios: mim trabalha, mim caça, mim pesca. O sujeito é sempre eu: pra eu anotar, pra eu escrever, pra eu resolver, pra eu comprar.
“Haverão protestos”: No sentido de existir ou ocorrer, o verbo haver só se flexiona na 3ª pessoa do singular: Há três pessoas na sala. Haverá protestos contra o racismo. Houve distúrbios nas manifestações.
“Meia louca”: No sentido de “um tanto”, é a vez de meio. Invariável — sem feminino, masculino, singular ou plural: Ela é meio louca. Estou meio estressada. Ficamos meio cansados com a quarentena. O noticiário está meio repetitivo. Só no sentido de metade ou de modo, maneira, esfera, veículo, procedimento ou método meio é variável: Tomei meia dose. Comi meia pizza. Estudei os meios de comunicação. Há um meio mais fácil de resolver essa questão? Os fins não justificam os meios.
“Soa” em vez de “sua”: Soa é forma do verbo soar. Sua, do verbo suar: A campainha soa. O trabalhador sua (transpira).
“Graças à Deus”: Deus é nome masculino. Não aceita crase como barco a vapor, bebê a bordo, a menos que se subentenda a palavra 'moda': redação à (moda de) Jorge Amado.
“Vou com tu”: O pronome se junta à preposição: Vou contigo.
“Mal humor, mau humorado”: Mau é o contrário de bom. Mal, o oposto de bem. Na dúvida, basta apelar para o troca-troca: mau humor (bom humor), mal-humorado (bem-humorado“.
“Fazem 10 anos”: Na contagem de tempo, o verbo fazer é invariável. Fica sempre na 3ª pessoa do singular: Faz um ano. Faz 10 anos.
“A dó”: É sempre masculino: O dó é sentimento de piedade, pena, compaixão. Tenho muito dó dos médicos que têm de escolher quem vai viver e quem vai morrer. O dó também é uma nota musical. Esse erro ocorre por associação com as palavras já citadas. Embora sejam sinônimas, dó é substantivo masculino e as demais são femininas.
Mais / mas
Mais = o contrário de menos. Exprime quantidade ou adição: Trabalho mais (menos) que Maria. Sete mais três são dez. / Sete menos três são quatro.
Mas = conjunção adversativa. Exprime ideia oposta, contrária à lógica: Ele estudou muito, mas não passou na prova. (Se estudou muito, deveria ter passado, mas…)
A ver / haver
A ver = ter relação, corresponder, dizer respeito a: Minha história tem tudo a ver com a de Paulo. Este fato não tem nada a ver com aquele. Tudo e nada aa haver existe, mas significam tudo ou nada a receber: Ainda tenho tudo a haver do dinheiro herança de meus avós. / Não tenho nada a haver de meus clientes.
Haver = verbo (existir): Segundo a ONU, no mundo deve haver 60 milhões de crianças sem acesso à internet. O emprego do verbo haver oferece dificuldades aos falante. Vai haver aula?
Acento / assento
Acento = sinal gráfico: agudo (´), grave (à) e circunflexo (^). Todas as palavras proparoxítonas levam acento.
Assento = lugar onde se senta: assento preferencial, assento na ABL, assento dianteiro. No ônibus, cedi meu assento ao senhor idoso.
A gente / agente
A gente = nós. Exige o verbo na 3ª pessoa do singular: A gente vai sair mais cedo. Quer sair com a gente? A gente quer ficar em casa, mas nem sempre pode.
Agente = ser que executa uma ação: agente penitenciário, agente secreto, agente da passiva.
Óculos
Óculos só se usa no plural: meus óculos, óculos escuros, óculos importados, óculos de sol, óculos de grau.
Privilégio
Privilégio tem dose dupla de i, vem de privado. Previlégio não tem vez. Xô! Esse erro ocorre por associação com palavras que começam com o prefixo pre.
Com certeza
Com certeza se escreve assim, um lá e outro cá. Concerteza e conserteza não existem.
Subsídio
Subsídio joga no time de subsolo. Com a duplinha, o som z não tem vez. Xô! Tal erro ocorre por associação com obséquio, subsistência e subsistir.
Da mesma forma, o S na palavra transubstanciação soa SS e soa Z na palavra trânsito.
Estupro
Estupro se escreve assim. O r fica na última sílaba. Muitos o mudam de lugar. Escrevem estrupo. Nada feito. Estrupo existe, mas é um termo antigo para barulho ou tumulto.
Por hora / por ora
Por hora = a cada 60 minutos: Recebe R$ 100 por hora de trabalho.
Por ora = por agora: Por ora, a velocidade máxima na via é de 60km por hora.
“Vítima fatal”
Fatal significa “que mata”. O acidente mata. É fatal. A queda mata. É fatal. O veneno mata. É fatal. O disparo mata. É fatal. O coronavírus mata. É fatal. Quem morreu não matou. É vítima. Ou morto.
A pessoa não mata, morre: O acidente fez duas vítimas. No acidente, morreram duas pessoas. Saldo do acidente: dois mortos.
“Outra alternativa, única alternativa”
Alternativa é sempre outra. Como só há uma, é sempre única: Com a propagação do coronavírus, a alternativa é o isolamento social. Se for mais de uma, troque por saída ou opção.
“A muito tempo”
Na indicação de tempo, olho no tempo:
o passado pede o verbo haver: Cheguei há pouco. Ele morou em Brasília há cinco anos. Trabalhamos aqui há 10 meses.
o futuro dá a vez à preposição a: Viajo daqui a pouco. A quatro meses das eleições, não há definição sobre possível adiamento.
“Há dois anos atrás”
Há indica tempo passado. Atrás também. Os dois juntos formam baita pleonasmo. Fiquemos com um ou outro: Há dois anos fui aos Estados Unidos. Dois anos atrás fui aos Estados Unidos.
“Qüestão”
Questão joga no time de quente, química, guerra e guitarra. O u é mudo. Não se pronuncia. O mesmo se aplica aos derivados: questionar, questionário, questionamento, questionável, questiúncula, questor etc.
“Melhor preparado”
O particípio sofre de alergia. Quando melhor se aproxima dele, espirros se sucedem. Que tal evitar contratempos? O mais bem pede passagem: Paulo está mais bem preparado que Maria. Vou selecionar o texto mais bem escrito. Dizem que as francesas são as mulheres mais bem vestidas da Europa.
De encontro x ao encontro
De encontro a = contra, em sentido contrário: O carro foi de encontro à árvore. O projeto vai de encontro aos desejos do governador.
Ao encontro de = em favor de, na direção de: O projeto veio ao encontro dos interesses de estudantes. O filho correu ao encontro do pai.
Ao contrário / diferentemente
Ao contrário = o contrário, o oposto (sair x entrar, morrer x sobreviver, aprovar x reprovar): Ao contrário do prometido (ficar em casa), saiu tão logo o telefone tocou.
Diferentemente = de forma diferente: Diferentemente do publicado na edição de ontem, o brinquedo custa R$ 50, não R$ 500.
Independente / independentemente
Independente = livre, soberano, autônomo: O Brasil ficou independente em 1822.
Independentemente = sem levar em conta: Ganha o mesmo salário independentemente do número de horas trabalhadas.
Embaixo, em cima
Embaixo se escreve junto. Em cima, separado: O sapato está embaixo da cama; o livro, em cima da mesa. Em baixo existe, mas apenas quando baixo funciona como adjetivo.
Tampouco / tão pouco
Tampouco = nem: Maria não fez a prova e tampouco deu explicações.
Tão pouco = muito pouco: O deputado falou tão pouco que surpreendeu. Comeu tão pouco que deixou a mãe preocupada. Peço tão pouco!
Onde / em que
Onde indica lugar físico: A cidade onde nasci tem 2 milhões de habitantes. A gaveta onde guardou os documentos está trancada. Minha terra tem palmeiras / onde canta o sabiá.
Em que indica lugar virtual ou figurado: Na palestra em que falou sobre a pandemia, o ministro foi muito questionado. No debate em que o deputado sobressaiu, havia muitos eleitores da oposição. Lembrou-se do encontro em que se viram pela primeira vez.
Aonde
Só se usa com verbo de movimento que exige a preposição a: Aonde ele foi? Não sei aonde ele foi. Talvez ele saiba aonde ela foi.
Superdica
Pintou a dúvida? Parta pro troca-troca. Substitua a por para. Se couber, vá em frente. Dê a vez ao aonde: Aonde ele foi? Para onde ele foi? Não sei aonde ela foi. Não sei para onde ele foi. Talvez ele saiba aonde ela foi. Talvez ele saiba para onde ela foi.
O qual / que
O qual tem vez se o pronome for antecedido de sem ou de sob, preposição com mais de uma sílaba ou locução prepositiva. Se não, prefira que: O senador a que se referiu é líder do partido. O livro de que lhe falei está esgotado. A casa sobre a qual lhe falei está à venda. O público perante o qual se manifestou se manteve indiferente.
“Interviu”
Intervir é filhote de vir. Os dois se conjugam do mesmo jeito: eu venho (intervenho), ele vem (intervém), nós vimos (intervimos), eles vêm (intervêm); eu vim (intervim), ele veio (interveio), nós viemos (interviemos), eles vieram (intervieram); se eu vier (intervier), se ele vier (intervier), se nós viermos (interviermos), se eles vierem (intervierem). Etc. e tal.
“Se ele obter”
O futuro do subjuntivo tem pai e mãe. Os inexperientes acham que ele nasce do infinitivo. Mas o pai dele é outro. Ele nasce do pretérito perfeito do indicativo. Ele Mais especificamente da 3ª pessoa do plural menos o -am final. Assim:
Pretérito perfeito: obtive, obteve, obtivemos, obtiver(am)
Futuro do subjuntivo: se eu obtiver, ele obtiver, nós obtivermos, eles obtiverem
“Se eu ver Maria”
Trata-se do futuro do subjuntivo. Vale a regra 6:
Pretérito perfeito: eu vi, ele viu, nós vimos, eles vir(am)
Futuro do subjuntivo: se eu vir, se ele vir, se nós virmos, se eles virem
“Se ele fazer”
Trata-se do futuro do subjuntivo. Vale a regra 6:
Pretérito perfeito: eu fiz, ele fez, nós fizemos, eles fizer(am)
Futuro do subjuntivo: se eu fizer, ele fizer, nós fizermos, eles fizerem
“Se eu pôr”
Trata-se do futuro do subjuntivo. Vale a regra 6:
Pretérito perfeito: pus, pôs, pusemos, puser(am)
Futuro do subjuntivo: se eu puser, ele puser, nós pusermos, eles puserem
“Houveram manifestações”
O verbo haver, no sentido de ocorrer e existir, é impessoal. Só se conjuga na 3ª pessoa do singular: Houve manifestações em frente ao STF. Havia recursos a analisar. Há 10 pessoas na sala.
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